segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Anorexia e Morte no Instagram – Quando se Encaixar num Padrão Pode Custar Caro Demais

Anorexia e Morte no Instagram – Quando se  Encaixar num Padrão Pode Custar Caro Demais

“Meus heróis morreram de overdose”. Lindo, porém doentio. Doentio, porém verdadeiro para o Cazuza, para mim e para muitos de vocês. Amy Winehouse é a minha trilha sonora de todo santo dia. É ela quem canta na hora do meu banho, dentro do metrô, antes de eu dormir e enquanto escrevo este texto. Ela morreu. De overdose de álcool. E talvez,se eu já não tivesse 21 anos nas costas e alguns calos nas mãos na ocasião da morte dela, não saberia separar as coisas: o que eu sempre admirei nela foi o talento, a doçura e as roupas; os vícios dela eu nunca quis pra mim. Tenho lá os meus hábitos condenáveis, confesso. Pode ser que sejamos surpreendidos pelo destino, mas minha trajetória não aponta que morrerei de overdose – a não ser que seja de amor.
E se nossos heróis morreram de overdose, na semana passada, a heroína de alguns jovens morreu de anorexia. Eu nunca havia ouvido falar nela, mas os mais de 6 mil seguidores no Instagram conviviam diariamente com fotos de uma beleza doentia. Daiane Dornelles, a magérrima webcelebridade de 21 anos, contraiu uma hepatite viral em decorrência da fragilidade provocada pela anorexia nervosa e não resistiu. E trouxe à tona um debate que não deveria jamais sair de voga: para onde a nossa paranoia por seguir um padrão de beleza determinado pela indústria da moda e do entretenimento está nos levando? Para clínicas de estética, para hospitais, para o caixão. Para qualquer lugar, menos para onde deveríamos estar: no campo da autoaceitação.
Sou gorda(o) demais. Sou branquela(o) demais. Meu cabelo é enrolado demais. Sou peituda de menos. Quantos desses lamentos você já ouviu de amigos ou até de você mesmo? E quantos deles já fizeram intervenções para ~corrigir~ o que lhes desagradava? Uma escova progressiva, uma prótese de silicone ou um bronzeamento artificial podem parecer coisas totalmente banais. E realmente são, mas até a página dois. A imposição pelo corpo perfeito, pelo rosto perfeito e pelo cabelo perfeito fez do mundo uma produção de humanos em série. De pessoas paranoicas que não se aceitam da maneira como são. A menina que é escrava da escova progressiva, assim como a que sofre de anorexia, é vítima. É óbvio que em graus diametralmente diferentes. Mas são vítimas do discurso esmagador que nos quer Barbies e Kens na balada, nas fotos do Facebook e nas entrevistas de emprego.
E nós absorvemos tão bem esse discurso, mas tão bem, que criticamos a novela que ousa colocar uma personagem negra como protagonista. Que pedimos à gordinha vocalista da banda que “se coloque no seu devido lugar”. Que hesitamos em fazer cafuné no amigo de cabelo pixaim. Que aplaudimos toda e qualquer transformação que nos coloque mais perto do ideal de beleza. O Instagram de Daiane é um verdadeiro show de horrores. À medida que a menina ia emagrecendo e postando fotos de sua tão cobiçada barriga negativa, os likes cresciam em progressão geométrica. Comentários demonstrando inveja e admiração pela determinação de Daiane são numerosos. Muitos dos seguidores se recusam até mesmo a admitir que a menina morreu em decorrência de um problema de saúde que foi agravado pela anorexia.
E é assim que seguimos: lavando as nossas mãos que dão likes nas fotos de tantas Daianes que existem por aí, apontando o diferente como feio e nos negando a enxergar a realidade. A respeitar a diversidade. A admitir que somos todos, ao mesmo tempo, vítimas e algozes desse mal nada silencioso: a padronização dos corpos e dos rostos. Eu tenho lá os meus fantasmas, assim como todo mundo. Mas se tem uma coisa que acho bonita, meu amigo, é a saúde.

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